Cartola:
Ainda é
cedo, amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Preste
atenção, querida
Embora
eu saiba que estás resolvida
Em cada
esquina cai um pouco a tua vida
Em
pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me
bem, amor
Preste
atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinho
Vai reduzir as ilusões a pó
Preste
atenção, querida
De cada
amor tu herdarás só o cinismo
Quando
notares estás à beira do abismo
Abismo
que cavaste com os teus pés
O Mundo é Um Moinho
fonte: http://letras.mus.br/cartola/44901/>
[o negrito é por minha conta]
Heráclito
(dos fragmentos):
"No mesmo rio
entramos e não entramos, somos e não somos."
fonte:Os
pensadores, ed. Abril, 1973, p. 90.
A música, do genial Cartola, adverte a pessoa que sair para o
mundo é perigoso e imprevisível, um moinho, cujas engrenagens podem derrubar
todos os nossos projetos de vida. Eu gostaria de sugerir não exatamente uma
semelhança da música de Cartola com o fragmento de Heráclito, mas um
complementação. Sim, o movimento, bem como o tempo, é como um rio, onde
entramos e não entramos - somos e não somos, isto é, apesar da mesma aparência,
minha e do rio, a essência já não é mais a mesma ("Em cada esquina
cai um pouco a tua vida").
E mesmo
a aparência também já não é mais a mesma, pois não percebemos a mudança no
curto tempo, mas na longa duração, aproveitando aqui marginalmente o conceito
de Braudel.
Mas
também da vida faz parte um moinho, o engenho social no qual nos incluímos e
por meio do qual atuamos. Nesse moinho ninguém deixa de passar e a cada momento
um pedaço de nós se vai, transformando-nos sempre em outra coisa que não nós
mesmos, apesar de lutarmos para manter a identidade, os projetos, os sonhos.
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