História da Filosofia para iniciantes.
ROBINSON, Dave; GROVES, Judy. Entendendo Filosofia, um Guia llustrado. Trad. Marly N. Peres. São Paulo, Ed. Leya, 2012.
ROBINSON, Dave; GROVES, Judy. Entendendo Filosofia, um Guia llustrado. Trad. Marly N. Peres. São Paulo, Ed. Leya, 2012.
Costumo ler obras de introdução ao pensamento e à filosofia e mesmo aqueles que nunca fariam parte de uma bibliografia mais séria. Este é um deles, bem ilustrado.
Poderia ser um bom
guia introdutório, mas o autor faz simplificações demais sobre alguns autores,
a começar pelos antigos. Além disso, adota uma posição nitidamente parcial ao
dar como certo alguns elementos da filosofia e como equivocado outros. Com relação
aos pensadores da Igreja, por exemplo, há um total preconceito com relação a
eles, tratando-os de forma estereotipada e caricata.
Apesar de algumas
partes bem inspiradas, no geral não recomendo, nem como livro de introdução,
nem como base de consulta. No todo, não faz jus a outros livros da mesma
coleção, como os de psicologia, por exemplo. Mas quem ainda quiser ler alguma
parte bem aproveitável, pode comprá-lo e ler a partir da página 100,
aproximadamente. Ou ler com reservas as primeiras cem páginas, não descuidando das demais.
As ilustrações são
excelentes. Há um gráfico interessante ao final do livro - uma espécie de
evolução cronológica da filosofia.
O início até que é
bom, como podemos verificar à página três, na introdução, onde o autor coloca
"questões" que a filosofia procura responder, tais como:
-Qual
é a natureza da realidade? O que vem a ser efetivamente a existência humana, o
que são os seres humanos?
-Podemos
ter certeza efetiva a respeito de alguma coisa?
-O
que é a verdade? O que é significado?
(...)
Entre outras
questões muito interessantes, como "somos
realmente livres para decidir o que somos e o que fazemos?" , "o conhecimento científico é melhor dos que os
outros", "qual a relação entre
a linguagem humana e a verdade?"
Quem se basear nesta
introdução para comprar o livro vai se arrepender, pois ele não responde de
forma satisfatória às questões propostas, pelos motivos já expostos na chamada
desta resenha, seja uma delas, a versão
simplificadora e de senso comum (demais) a respeito dos filósofos. Um livro de
filosofia cheio de clichês, é o que
temos ao final - não é possível ter uma boa ideia a respeito dos autores
filosóficos. É bem verdade que o livro começa a ficar bem melhor no final,
especialmente quando debate as questões da linguagem e quando trabalha os
autores pós-modernos. A parte das origens da Filosofia Moderna, à página 54,
também está boa e bem explicada.
Vejamos algumas
"deturpações":
A chegada do cristianismo - p.41 e segs.
Simplifica demais os argumentos teológicos, reduzindo-os à questão do poder da
Igreja. Afirma também que a Igreja "reprimia ativamente qualquer ideia ou
visão de mundo independente". Isso não é verdade, pois a repressão às
ideias não veio como a chegada do cristianismo, mas sim com a Reforma Católica,
já na modernidade. Além disso, o que se denomina por "monopólio" nada
mais foi do que o exercício de um saber em que somente alguns estavam
preparados para isso, tal como os membros da Igreja. É bem verdade também que a
Igreja, a partir de fins da Idade Média e início da Modernidade, requisita a
exclusividade sobre o saber, pois está em jogo a questão da Verdade. Não se
impediu com isso que se desenvolvesse um pensamento autônomo, independente - e
mesmo dentro Igreja. Não se impediu também que a própria Igreja fosse combatida
e atacada. Portanto, houve uma tentativa de monopólio, sim, inclusive
jurisdicionado pela própria Igreja, mas nunca foi totalmente exercido, nem tampouco
totalmente obedecido. Ademais, como eu já disse, houve pensamento independente
dentro da própria Igreja, tal como Marsílio de Pádua, para ficar apenas em um
exemplo.
O primitivo estado de inocência de Rousseau -
p. 71. Aqui está um bom exemplo de total desinformação a respeito do filósofo.
O autor afirma que Rousseau pregava uma volta ao primitivismo e à natureza.
Onde Rousseau escreveu isso? Essa "volta à natureza" foi explorada
depois pelo romantismo, como afirma corretamente o autor, mas Rousseau nunca
disse isso assim. O que Rousseau afirma em seus escritos é que isso seria bom,
mas não é mais possível. A civilização torna o homem "mau", ao passo
que nas sociedades primitivas o homem é "bom". Portanto, o homem não
é essencialmente "mau", sendo possível torná-lo melhor com a educação
- uma visão que seria mais tarde aproveitada pelos revolucionários franceses.
Pragmatismo - p.107. Faz uma avaliação elogiosa
demais à essa corrente filosófica, ao afirmar que ela seria a filosofia
norte-americana libertária mais importe e autêntica. Mas, libertária em relação
a quê? ao Estado?ao indivíduo? ao poder econômico? ou à metafísica? Parece que
mais em relação a esta última, mas o autor poderia ter deixado isso mais claro.
Sobre Noam Chomsky - p. 104. Não é verdade que
Chomsky se coloca somente contra o governo e as agências estatais. Ele o faz
também com relação à mídia e às grandes corporações privadas, que por sua vez
influenciam e exercem seu poder sobre a mídia. O autor parece não ter lido nada
sobre Chomsky, nem ter acompanhado sua luta política.
Teoria da falsificação. Sobre a tradução deste
termo - p. 150. Afora alguns termos que nos parecem "esquisitos", há
um que realmente peca, apresentado na página 150: "falsificação". A
teoria de Popper não é a da falsificação, mas a da refutação. Ocorre que dentro
da teoria da refutação, temos o que denominamos de "doutrina do
falseamento". Veja: falseamento, não falsificação. Os termos em filosofia
(não só nela) têm que ser preciso, pois expressam conceitos. Além da tradução
ser imperfeita, a explicação da teoria filosófica, própria do autor (Robinson),
também é confusa. Nesta mesma página
menciona a psicanálise freudiana como "pseudociência". O que seria uma pseudociência para o autor?
Uma quase ciência? Uma ciência em que não é possível apresentar provas
materiais ou que não possui método científico? Isso seria suficiente para
algumas teorias receberem a alcunha de "pseudociência"?
Obrigado amigos.
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