Snakes, Escher, 1969 |
Causou surpresa e espanto a muitos do Ocidente um evento
eleitoral recente na Europa, a indicar o avanço da extrema direita sobre o
Parlamento Europeu, levando Macron, na França, a dissolver a Casa e antecipar
eleições [1].
O que é espantoso, ao fim, é a própria
surpresa com que a mídia e a opinião pública receberam a notícia, como expressou
essa mesma que citamos nas notas. Não deveria ser novidade a ninguém. A ala
política da direita mais extremista, de caráter nitidamente neofascista, vem
ganhando espaço — entretanto, esse fenômeno não é recente. O que aparentemente
surpreende mais a audiência midiática é o caráter fascista de como se
apresentam candidatos e eleitos, especialmente em sua forma de comunicação e propostas,
sem revelar diretamente um “projeto fascista”. O arcaísmo das posições políticas
e a truculência de sua difusão amedrontam, mas não provocam grandes ações
concretas em contrário, à exceção de algumas manifestações contra, embora até
mesmo reprimidas pelos governos que se dizem democráticos [2]. Portanto, há uma
permissividade, não só da mídia, mas de instituições e órgãos públicos, que
reagem de forma pusilânime às investidas da extrema direita neofascista.
Quais as razões dessa onda?
A Europa vem sendo pressionada à
direita por ordem dos fatores imperiais: Departamento de Defesa norte-americano/OTAN,
que operam por variados meios no continente desde o fim da Segunda Guerra [3]. Antes
da queda do bloco soviético, ou seja, durante a Guerra Fria, o objetivo era
deter qualquer avanço dos partidos comunistas na parte ocidental europeia.
Esses dispositivos não foram totalmente
desativados, pelo que podemos depreender das atividades políticas nas últimas
décadas neste continente. Já bem observou José Luís Fiori que os governos
europeus, quaisquer que fossem, de centro, direita ou esquerda — e desde o
advento da Primeira Guerra Mundial — sempre apoiaram a guerra imperialista e
após a Segunda Guerra Mundial se incorporaram à OTAN, transformando-se em força
auxiliar da estratégia militar norte-americana [4]
Após a “Queda do Muro”, novos
mecanismos foram introduzidos e constituídos naquilo se convencionou chamar de Guerra
Híbrida. E especialmente a França é que sofreu duramente esses ataques e essas
imposições — como bem observou Hervé Juvin [5] instituindo o caos por meio da
promoção da “luta anticorrupção”, onde várias empresas nacionais foram
perseguidas juridicamente, segmentadas e com perda de capital. Alguma semelhança
na memória? Sim, é o lawfare. É a Lava Jato. E entram também novos
atores da chamada “Nova Direita Mundial”, liderada por Steve Banonn, a partir
da empresa Cambridge Analytica, além de muitos outros think tanks,
a operar em países como a Itália, por exemplo, que desde o princípio, no século
XX, como bem atestou Giuliano da Empoli, foi palco das experiências políticas que
posteriormente se multiplicaram no mundo inteiro [6].
Fica claro o apoio destes agentes
aos partidos de extrema direita, que ao fim, como escreveu da Empoli, trata-se
de movimento de concertação mundial. Esse movimento se intensificou nas últimas
duas décadas, onde temos movimentos extremistas direita que se valem dos vários
problemas que afetam o continente europeu, tal como o da imigração, o do desemprego,
entre outros.
Muitos dos movimentos de protesto
atuais, tais como os “coletes amarelos” na França, seguem a receita da máquina
do caos empreendida por Bannon e atuam a mover os governos do centro à direita.
A situação política só tende a piorar agora com a Guerra da Ucrânia, empurrando
a Europa mais ainda à direita. É o que vem ocorrendo nos protestos contra a
importação de grãos da Ucrânia, uma nítida operação de ajuda àquele país
empreendida pelos governos europeus; assim se dá na Polônia [7] bem como no
restante de outros países [8] daquele Velho Mundo, mesmo com fortes receios da EU
e a impor alguma regulação e/ou restrição [9] de modo a não desequilibrar
seriamente as economias regionais, da qual a UE enfim depende.
Conclusões.
O movimento de extrema direita
neofascista avança na Europa emulado por vários fatores, como observamos:
agentes externos (OTAN/Departamento de Estado norte-americano, Bannon) somados a
e alimentados por problemas internos — crise econômica, energética e social,
esta última decorrente principalmente das constantes e enormes imigrações que a
Europa deve tolerar, de forma violenta ou não — causadas pelas guerras
estadounidenses no Oriente Médio, no propósito claro de dominar as reservas petrolíferas
na região.
A imigração é quadro geral de
maior apelo populista para os partidos de direita na Europa, levando os
partidos de centro (e não só) a tomarem medidas duras contra os próprios cidadãos,
como advogaram os governantes desde a queda do muro, a favor de medidas
neoliberais, especialmente na França e na Itália. O que temos é uma Europa fragmentada
e fragilizada que, como descrevemos acima, desde a Segunda Guerra é controlada pelas
forças do Atlântico Norte. Os Trinta Anos Gloriosos (1945-1975), de economia
crescente e forte desenvolvimento social, acobertaram o fato de uma Europa
tutelada. Tutela que se tornou manifesta quando dos movimentos políticos de
libertação do fascismo ou congêneres em países como Portugal, Grécia, Espanha e
Turquia, nos idos dos anos 1970 — em nenhum destes países o socialismo pode
avançar, devido justamente, em uma breve síntese, às operações encobertas da
OTAN e outros mecanismos de controle estadunidense. Mas não só. A mídia
ocidental europeia veicula cinicamente seu espanto, como se não pudesse
oferecer forte resistência ao movimento neofacista, apresentando-o como uma
evolução natural da política e do desejo social. Ocorre que as Agências Internacionais Notícias
(Reuters, EFE, ANSA, AFP, DPA, UPI, entre outras) e que são diapasões dos
interesses ocidentais, inter alia e praesertim, norte-americanos, interagem
intimamente com outros canais espalhados pela Europa e pelo mundo, a
estabelecer um consenso fabricado, como bem afirmou Chomsky, em uma de suas
entrevistas [10] e no seu livro Midia, que demonstra como é realizada a
construção da opinião pública no Ocidente [11]. Consenso este, fabricado de tal
modo, que nunca irá contra os interesses estadunidenses, mas cujos efeitos
estão levando a Europa para um abismo. Ou para uma guerra, que seria o maior
dos abismos.
Enfim, os EUA mantêm a Europa na
linha de frente — praticamente como uma proxy war — contra a Eurásia, especialmente e desde sempre
contra a Rússia. A Guerra da Ucrânia somente desvelou esse cenário e acentuou a
crise geral que vem sendo sentida fortemente desde os anos 1990.
É um sumário, que merece maior e melhor
desenvolvimento.
Notas.
[4] FIORI, José Luís. “A social-democracia e a
guerra”. In: A guerra, a energia e o novo mapa do poder mundial.
Petrópolis, RJ: Vozes; Rio de Janeiro: INEEP, 2023. pp. 44-48
[5] JUVIN, Hervé. De La Lutte
Anticorruption Au Capitalisme Du Chaos. Sécurité, huit thèses sur une révolution
du droit. Sécurité globale 2017/1 (N° 9), p. 39-57. DOI 10.3917/secug.171.0039
[6] EMPOLI, Giuliano da. Os Engenheiros do
Caos. São Paulo: Vestígio, 2019 (ed. Digital Epub), Capitulo I: O Vale do
Silício do Populismo.
[10] https://diplomatique.org.br/a-grande-fabrica-de-consensos/
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