Escher - Côncavo e convexo - 1955 –
Litografia - Escher Collection, Gemeentemuseum Den Haag, The Hague, the
Netherlands © The M. C. Escher Company, the Netherlands. All rights reserved.
"São
Paulo, aberta 24 horas." Não mais. Ao
menos não para todo mundo, pois lugares seguros depois das vinte horas são
caros e o transporte por sua vez já faz algum tempo que não funciona mais após
a meia-noite. Os shoppings fecham às vinte duas. É interessante como
ainda sobra festa na cidade, em lugares fechados, "baladas". É essa a
cidade cosmopolita, que engoliu o espaço público?
"São
Paulo, onde você encontra de tudo para comer e onde há cozinha do mundo
inteiro." Não mais. Pelos mesmos motivos acima. Além
disso, a maior parte das refeições agora é via fast food ou algum
restaurante desse tipo disfarçado, como alguns mexicanos ou indianos por aí.
Existe um turismo gastronômico em São Paulo para todo tipo de bolso. Achar que
vai comer uma comida típica é outra coisa. No mesmo raciocínio podemos incluir
as comidas regionais. Nestas ainda é possível, devido à permanência de pequenas
tradições, encontrar algo de original. Mas está cada vez mais difícil. Os chefs
de cuisine já dominaram o pedaço com suas cozinhas gourmets.
E
o que encontrar em São Paulo, facilmente? Prédios de apartamentos. Modelo de
cidade que foi se construindo ao prazer (e regalo) de empreiteiros e agentes
ligados ao capital imobiliário, não seria para menos. Políticos incluídos,
claro. O resultado...? Vejamos.
-Rios
de São Paulo. Todos cobertos ou canalizados. Nenhuma novidade. Já nos
acostumamos às enchentes, que já diminuíram sim, com... mais obras! (leia-se:
enormes buracos de concreto para escoamento das águas);
-Trânsito.
Cada vez mais infernal. Todos reclamam. Ninguém quer deixar o carro em casa,
com razão, pois o transporte público... bem, sabemos. E é caro, pois é preciso
subsidiar a "eficiência" da iniciativa privada;
-Árvores.
Cada vez menos árvores. E cada vez mais espanadores de pó (palmeiras). É um dos
fatores que torna o clima de São Paulo insuportável no verão e cruel no
inverno;
-Barulho.
Muito barulho. E existe até competição de quem faz mais barulho −̶ seja com música desambiente ou com som de
carro. Nem estou me referindo aos "pancadões", alvo preferido das
reclamações em jornais; buzinas, alarmes, TVs de 12 milhões de pessoas, tudo
isso junto formam um enorme ruído de fundo altamente contrastável com o
silêncio de quando vamos para o interior, por exemplo;
-Poluição.
A eterna poluição. Qual será a cor de nossos pulmões neste momento?;
-Sujeira.
São Paulo está se especializando nisso, a despeito das empresas de limpeza
terceirizadas, muito eficientes; a sujeira dos pombos está cada vez mais difícil
de limpar, até mesmo no Metrô. Ou São Paulo acaba com os pombos ou os pombos
acabam com São Paulo;
-Muros.
Grades. Portões de ferro. Deixam a cidade maravilhosamente embelezada, não? Mas
há um escape: o grafite. Isso quando não chega algum prefeito e manda pintar
tudo de cinza; há quem goste da arquitetura paulistana, que deita o passado ao
chão todos os dias;
-Segurança.
Não sei de quem tenho mais medo.
Esse
é o conjunto de coisas que nos incitam à intolerância e à falta de civilidade
entre nós, pois não há como existir qualquer coisa assim num ambiente tão
hostil e inóspito. Mas há quem ponha a culpa no caráter do brasileiro, que,
segundo esse tipo de avaliação, "não se adapta à vida da sociedade
democrática" ou qualquer outra bobagem liberal do gênero.
Alguma
coisa de boa? Lógico que a oportunidade de emprego e de moradia são elementos
fundamentais numa cidade. Isso São Paulo já fez melhor −̶ mas ainda é a esperança de milhares de
famílias. Estas merecem a verdadeira homenagem, pois são elas que mantêm a
cidade ainda viva, fazendo circular algum sangue no corpo degradado de concreto
vertical.
Parabéns
povo de São Paulo. Aquele que trabalha mesmo. E só.
"De uma
cidade, não aproveitamos as suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas a
resposta que dá às nossas perguntas."
Italo Calvino,
Cidades Invisíveis, III
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